Pela abundância com que ocorreu na laguna e pela sua qualidade alimentar, a enguia é uma imagem da Ria de Aveiro, diremos que um ex-libris. A pesca exercida sobre esta espécie espalhava-se da Torreira à Vagueira, através do chinchorro, com galrichos, numa área mais ampla, e à sertela (ou minhoqueiro). As capturas eram abundantes e fomentaram duas atividades económicas que ainda persistem e continuam a ser de relevo elevado para a região: o turismo gastronómico e a indústria conserveira.
A enguia permitiu o florescimento de uma variedade rica e substancial de menus culinários, promovidos por um festival gastronómico, realizado na Murtosa, que tem vindo a apurar a qualidade da oferta, ao longo dos anos, numa confeção ímpar. A promoção da qualidade e da originalidade na preparação do que, com aparente simplicidade, os incautos presumiam ser apenas uma simples caldeirada ou uma mera fritada em molho de escabeche, tem vindo a transformar a gastronomia da enguia numa dimensão sofisticada, baseada na tradição, num produto gourmet que atrai múltiplos e diversificados visitantes para a sua degustação.
A importância do gosto culinário da enguia aguçou o engenho de a transformar num produto que levasse bem longe o aroma e o sabor da Ria de Aveiro. As conservas ganharam realidade e tradição e, simulando as velhas barricas ou em lata, correm as quatro partidas do mundo, mantendo a Ria de Aveiro sempre por perto, sobretudo de quem se viu forçado a abandonar a sua região. A enguia é, assim, uma marca indelével das gentes ribeirinhas de toda a região.